Taiasmin Ohnmacht
─ Eu tenho aula hoje, esqueceu?
─ Sábado à noite?
É
muita desfaçatez, ela fala como se tudo fosse normal. Sábado à noite, véspera
de finados. Aula de quê? Que maldito curso de idiomas é esse?
Enquanto
ela se arruma, eu me sinto um idiota. Deveria ter colocado um detetive atrás
dela como o Vilmar sugeriu, mas nunca confiei na opinião do meu sócio sobre as
mulheres; para ele, todas são vagabundas. E vou descobrindo que ele tem razão.
Ela
se despede com um beijo rápido, bonita como sempre em sua esvoaçante saia
branca, e eu a odeio por sua beleza. Espero ela sair e vou atrás. Ridículo! Um
homem de quarenta e dois anos se prestando a esse papel, mas mais ridículo é
saber que minha mulher me trai e não fazer nada.
Desço
pelo elevador de serviço e chego antes na calçada, consigo um táxi com
facilidade e espero ela sair. Sei que demora porque acaba de se maquiar no
carro. Ela sai da garagem e eu a sigo, pedindo a todos os santos para estar
errado. O taxista logo deduz o que se passa e parece dirigir com mais presteza
enquanto me conta que já passou por situação semelhante e também do caos em que
sua vida se transformou depois da separação. O carro entra em um estacionamento
do Bom Fim e em seguida ela sai com a bolsa e uma sacola que desconheço.
Desembarco do táxi e o motorista penalizado não cobra a corrida.
─ Cara, eu sei que é difícil, mas perdoa.
Se é ruim com elas, pior sem.
Existe
legítima defesa da honra contra taxistas metidos?
Aproveito
as sombras das ruas mal iluminadas para me esconder. Só consigo imaginar que
está indo para um motel. Na verdade, espero que ela vá para um motel, a dúvida
me tortura mais do que a certeza.
Ela
anda tranquila pela noite vazia e se fosse uma estranha que passasse
casualmente por mim, eu me apaixonaria de novo. E o que mais dói é que, para
algum outro, ela é uma encantadora estranha, mas nunca mais para mim.
Não
acredito no que vejo! Quem é essa mulher? Não pode ser a minha! Oito horas da
noite e ela está entrando na Redenção! Corro para abraça-la e protegê-la? Digo
que podemos esquecer tudo e a convido para voltarmos juntos para casa?
Ela
para entre duas árvores, lança um olhar suspeito ao redor e desaparece na
escuridão do parque. Tomara que morra! Apesar disso a sigo e talvez morramos os
dois. Enquanto meus olhos se acostumam à escuridão, fico imaginando em quanta
merda estou pisando e em quanta camisinha usada. Felizmente vim com o sapato
que ela me deu no meu aniversário e do qual apenas fingi gostar.
Agora
ela é uma sombra de flutuante pano branco. A personificação de um espectro. De
que perversão essa mulher padece? Onde vai encontrar seu amante? Vejo luzes
fracas e tremulantes à distância. Sons abafados de vozes. É para lá que ela
está indo? Quantos são esses amantes? Ela se aproxima, todos a cumprimentam. Enquanto
estão concentrados na alegria do encontro, eu consigo me aproximar mais. Estou
a uns dez metros deles, atrás de um jacarandá. Há velas espalhadas por toda a
parte, reconheço um pouco atrás do grupo os pontos cardeais, enquanto vou perdendo
todas as minhas certezas e o meu norte. É um grupo grande, alguns tiram a
roupa, outros colocam. Mas já descartei a hipótese de ser uma suruba. Com
dificuldade localizo ela, trocando de roupa. Na verdade, a saia é a mesma, mas
agora há uma blusa branca solta e cheia de babados, muitos colares no pescoço.
Alguns homens começam a tocar tambores e outras mulheres cantam. Volto a
enxerga-la, mas não é ela. Fuma um charuto e dança como uma velha. Percebo que
de repente para, voltada a minha direção. Não é possível! Parece me ver! Aponta
o charuto para mim e solta uma longa e sonora gargalhada.
Corro
e por pouco não tropeço. Choro e rio ao mesmo tempo. Sair do parque foi mais
fácil do que entrar. Não há nada mais que possa me surpreender nessa noite. Vou
pegar um táxi e ir para casa. Preciso fazer a janta. Será que ela vai chegar
com fome?
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